A Gente Se Preocupa

A gente se preocupa
E isso causa tanto sofrimento,
Que pra não se magoar mais
A gente prefere o isolamento,
Diz que não se importa,
Que lava as mãos,
E que nessa história
Já não quer ser o artista,
Às vezes, chamo isso de proteção,
Às vezes, de burrice.
Só queria te dizer
O quanto entendo você,
Que não quero te ferir
Seremos assim mesmo
Formiga e formigão,
A obra e o artesão.
Eu juro cuidar de você
E você promete
Não largar a minha mão.

(Nik  Teixeira)

S/T

palhaco

Tem dias que me calo
Pra não fazer da boca o ralo
Podre do esgoto
Revelando calos
Relevando casos
Escondidos e escrotos.
Louco
Abocanhado,
Embasbacado
E com cara de dar nojo.

(Thálion C. G. Mibielli)
pernilongo_by_gutosposito

E os mosquitos zumbem de mim
Zombando do fim
Da sã consciência.

Voam pra longe daqui
Procuram um lugar
Sem concorrência.

Fogem do meu sangue ruim
E até preferem
Água benta.

(Thálion C. G. Mibielli)

S/T

Loucura
Muito tempo sem escrever
Me levou a divagar
E de vagar
Pelos vagões do vazio
Devagar encontro o fio
Entrelaçado nas tranças
Entre meados do cio
Entremead0s na dança
Dos pés na calçada
Procurando pela estrada
Tortuosa da razão
Tropeçando em quase nada,
Trafegando em contra-mão…

Thálion C. G. Mibielli

RADIO?!

tristes ondas dominadas
por um velho pequeno grupo
impondo modas “retro-renovadas”,
conservando ideologias,
atrasando tudo.

antigamente como hoje em dia,
transformando espirais em ciclos.
“aspirais” que vira lixo;
um “flashback” atual do futuro.
tampando buracos de invisíveis muros
à serviço de grandes gravadoras.

entediantes e tristes
devedoras de anunciantes
ignorantes de música boa.
afundadas em vícios e crises,
morrendo na rasa lagoa…

(Thálion C. G. Mibielli)
radioregionalfm radiocbn radioatlantida radio JP radioreccord radioband

No ônibus

Imagem

Estou na poltrona 29. Ninguém atrás de mim. Abro um pouco a janela para entrar ar. Aproximo meu rosto do vidro e deixo o vento bater na minha cara. Trepidação. Vasculho o mundo externo. Paisagem movediça, velocidade. Curva na estrada. O sol vai para o outro lado. Meu rosto é comprimido ao vidro. Afasto-me um pouco. Novamente a transparência, vítreo filtro translucido. Vazio enganoso. Vejo minha imagem refletida tenuamente neste vazio. Não resisto: contração dos músculos faciais: sorriso vazio: sorriso pra mim mesmo.

Meus olhos. Percorro os detalhes: Um, punhado de cílios eriçados. Dois, dobras de pálpebras, sulcos intermitentes: ora sulcos, ora pele esticada, fecho e abro com vagar o olho direito para constatar com o outro olho o movimento de planificação. Três, canto das lágrimas. Aquele cantinho em forma de bico de ave próximo ao nariz, por onde escapam as primeiras lagrimas de um choro, espremo um pouquinho a visão e vejo o bico diminuir em largura como que tentando fazer uma lagriminha teimosa cair. Não cai. Não há nada ali além do vermelho carnal desbotado próximo a elipse branca que emoldura a Iris. Quatro, ainda com a visão focada no lado esquerdo, começo a galgar a esfera branca duplo vitrificada: uma vez pela janela, outra por si mesma. Cinco, chego a semiplanisfera castanho central e vou além, até o pequeno circulo escuro no centro dos olhos: meus olhos refletidos que me encaram do vazio do vidro.

O silêncio é cortado pelo barulho do motor. Estamos saindo da cidade. As vezes o ônibus para. Algumas pessoas entram. Mas ninguém encara o fundo esvoaçante do ônibus. O tempo brinca comigo. É dobradura. Desassosego. Fecho os olhos. Bocejo. Abro os olhos. Sinto um repentino impulso de desviar o olhar. Desconforto. Resisto. São meus próprios olhos, afinal. Quantas vezes vi assim, de perto, num espelho, e sempre foram meus olhos, nada mais. Respiro fundo e mantenho minha posição. Ainda o desconforto. Tento resistir, mas sou vencido pelos meus próprios olhos. Deixo minha visão descansar no veludo da poltrona a frente. Medo. Sinto medo dos meus olhos. Eles sabem demais. Sou transparente pra eles. As estrelas me aparecem. No reflexo, meus olhos percebem um sorriso. Meus olhos permanecem nu, como vim ao mundo. Desde então, consegui vestir meu peito, meu sexo, minhas idéias. Meu olhar resistiu a calcificação do tempo. Quando anoiteço, eles permanecem em alerta. Armando dede cedo o cenário, turvo, e sinuoso de um novo tempo, como as águas de um rio que não cansa de correr. Quando amanheço, ele filtra em várias direções as afluentes, para a contenção de tempestades. Como um rebanho a procura de uma bica d’água. Como um poeta em busca das flores do bem. E quando, a saliva corrosiva de meu verbo não adianta, quando os preâmbulos afetivos do meu monologo se esgotam, e estou nu com o olhar, despido com o silencio, as águas vazam. Meus olhos vazios transbordam, e a minha janela, abre cortinas para o infinito.

(Thor Veras)

Sobre a chuva

Menina desce o morro,

O cacho dança,

Um gingado meio sem dono,

A bochecha cora,

Fica rosinha,

Como quem caiu no samba.

De perna roliça,

Caminha feito

Quem desenha a malicia.

O garoto da janela,

Que mora na esquina,

Calcula o tempo

Pra saber quando vai

Passar a menina.

Ela passa…

E nem sabe o que faz,

Recita Chico,

Canta Caetano ou

Chora Vinicius.

Ele pensa que

Tanta beleza,

Chega a ser grave ofensa.

O garoto quer chamar

A menina mulata,

Pra ter sua irmã,

Como cunhada.

Espera e conta as horas,

Pra ser dela

O namorado.

Mulata do morro

Sabe que é observada,

Guarda para o garoto

Muitas cartas

Estilo conto de fadas.

Tímido, meio covarde,

O garoto jura

Que chama a menina,

Se chover mais tarde…

Um amor de pequenas conquistas…

Eu torço,

Pra que a gente

Nunca desista…

 

 

(Nik Teixeira)

 

Di Cavalcanti - Mulata

Di Cavalcanti – Mulata

S/T

Sol que brilha, aquece o vento frio que corta minha ilha e essas águas geladas, que lavam meus pés deixando as marcas nessa mole praia; horizonte azul que me cega como uma bola cristal de previsões opostas ao que tento planejar. Percebo que não planejamos nada, apenas sonhamos com algo e assim tentamos alcançar. Ao sonhar conseguimos realizar, pois os sonhos são a força criadora; o planejamento é mera consequência.

Luan Silva

sol